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Deus de Misericórdia: O Primeiro Angelus do Papa Francisco

  • Foto do escritor: Islas Silva
    Islas Silva
  • há 1 dia
  • 6 min de leitura

Neste momento em que a Igreja se recolhe em oração e vive o luto pela partida do Papa Francisco, vamos lembrar com carinho o legado de seus ensinamentos durante seu pontificado. Dentre tantos, há um que merece ser revisto e meditado. Um que particularmente me marcou desde o dia em que foi feito: o seu primeiro Angelus, no dia 17 de março de 2013. Naquele domingo o Papa Francisco expressou com clareza o que guiaria o seu ministério, um prenúncio da defesa de uma espiritualidade centrada na misericórdia.


Com a praça de São Pedro tomada por uma multidão ansiosa graças ao recente anúncio do novo Papa, Francisco chegou sem formalidades com uma saudação calorosa:


 “Irmãos e irmãs, bom dia!”

Pode ser um exagero? Talvez. Mas acredito que esta simples saudação dentro de seu contexto já foi suficiente para perceber que estávamos diante de um pontífice que queria caminhar com os fiéis com mais intimidade. Alguém próximo, um amigo, um irmão.


A homilia que veio antes da oração do Angelus foi centrada no relato da mulher surpreendida em adultério (Jo 8, 1-11) e Francisco destacou a mansidão de Jesus ao condenar o pecado mas, para o pecador, o perdão. O Papa afirmou:


“Irmãos e irmãs, o rosto de Deus é o de um pai misericordioso, que sempre tem paciência. Já pensastes na paciência de Deus, na paciência que Ele tem com cada um de nós? É a sua misericórdia. Sempre tem paciência, tanta paciência connosco: compreende-nos, está à nossa espera; não se cansa de nos perdoar, se soubermos voltar para Ele com o coração contrito. «Grande é a misericórdia do Senhor», diz o Salmo.” 

E concluiu com uma frase que acabou se tornando um dos pilares espirituais do seu ministério por todo o tempo em que esteve na Cátedra de São Pedro:


“Não esqueçamos esta verdade: Deus nunca Se cansa de nos perdoar; nunca! «Mas então, padre, onde está o problema?» Bem, o problema está em nós que nos cansamos e não queremos, cansamo-nos de pedir perdão. Ele nunca se cansa de perdoar, mas nós às vezes cansamo-nos de pedir perdão. Não nos cansemos jamais, nunca nos cansemos! Ele é o Pai amoroso que sempre perdoa, cujo coração é cheio de misericórdia por todos nós. E, por nossa vez, aprendamos também a ser misericordiosos para com todos. Invoquemos a intercessão de Nossa Senhora que teve nos seus braços a Misericórdia de Deus feita homem.”

O Papa Francisco foi o Papa da Misericórdia desde o seu primeiro Angelus. Ali, Francisco nos convidou a não desistir nem mesmo do ato de pedir perdão. De reconhecer e não esquecer que Deus quer nos perdoar. É o um perdão que transborda, que cura feridas, que abre espaço para recomeços. Estas características identificadas pelo Papa comumente são encontradas em outras declarações como, por exemplo, na entrevista com o Padre Antonio Spadaro. Ali ele trouxe estas características de misericórdia e acolhimento para o ambiente da própria Igreja, que Francisco chamou de “hospital de campanha”:


“Vejo com clareza que aquilo de que a Igreja mais precisa hoje é a capacidade de curar as feridas e de aquecer o coração dos fiéis, a proximidade. Vejo a Igreja como um hospital de campanha depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido grave se tem o colesterol ou o açúcar altos. Devem curar-se as suas feridas. Depois podemos falar de tudo o resto. Curar as feridas, curar as feridas... E é necessário começar de baixo”

E ao final do Angelus, quase que de forma lógica dado o contexto presente naquele momento, o Papa fez um pedido que repetiria até os últimos momentos de sua vida: 


“Rezem por mim.”

Como apologetas católicos, refletimos sobre este momento inicial como um caminho a ser seguido. Entendemos que a verdade católica deve ser anunciada e sua doutrina defendida, mas sempre com compaixão. Entendemos que nossa função enquanto apologistas é expor a verdadeira fé cristã de forma que nosso trabalho seja testemunha do amor de Deus, que acolhe, perdoa e transforma.

Que o legado do Papa Francisco nunca se perca com o tempo e que sejamos sempre agradecidos pelo lembrete de confiar na misericórdia.


Abaixo, o Angelus completo:


 

Irmãos e irmãs, boa tarde!


Hoje, depois do primeiro encontro na quarta-feira passada, posso dirigir de novo a minha saudação a todos. E sinto-me feliz por fazê-lo ao domingo, no dia do Senhor. É bom e importante para nós, cristãos, encontrarmo-nos ao domingo, saudarmo-nos, falarmo-nos como agora aqui, nesta praça: uma praça que, graças aos mass-media, tem as dimensões do mundo.


Neste quinto domingo da Quaresma, o Evangelho apresenta-nos o episódio da mulher adúltera (cf. Jo 8, 1-11), que Jesus salva da condenação à morte. Impressiona o comportamento de Jesus: não ouvimos palavras de desprezo, não ouvimos palavras de condenação, mas apenas palavras de amor, de misericórdia, que convidam à conversão: «Também Eu não te condeno. Vai e doravante não tornes a pecar» (v. 11). Irmãos e irmãs, o rosto de Deus é o de um pai misericordioso, que sempre tem paciência. Já pensastes na paciência de Deus, na paciência que Ele tem com cada um de nós? É a sua misericórdia. Sempre tem paciência, tanta paciência connosco: compreende-nos, está à nossa espera; não se cansa de nos perdoar, se soubermos voltar para Ele com o coração contrito. «Grande é a misericórdia do Senhor», diz o Salmo.


Nestes dias, pude ler o livro de um Cardeal – o Cardeal Kasper, um teólogo estupendo, um bom teólogo – sobre a misericórdia. Aquele livro fez-me muito bem. (Não julgueis que estou a fazer publicidade dos livros dos meus Cardeais, porque não é isso…!) É que [o livro] me fez mesmo bem, muito bem... O Cardeal Kasper dizia que a melhor sensação que podemos ter é sentir misericórdia: esta palavra muda tudo, muda o mundo. Um pouco de misericórdia torna o mundo menos frio e mais justo. Precisamos de compreender bem esta misericórdia de Deus, este Pai misericordioso que tem tanta paciência... Recordemos o profeta Isaías, quando afirma: mesmo que os nossos pecados fossem vermelhos escarlate, o amor de Deus torná-los-ia brancos como a neve. Como é bela a misericórdia! Lembro-me que tinha sido feito Bispo há pouco, quando, no ano de 1992, chegou a Buenos Aires a imagem de Nossa Senhora de Fátima e organizou-se uma grande Missa para os doentes. Eu estive a confessar durante aquela Missa. E, quase no fim da Missa, levantei-me porque tinha que ir administrar o Crisma. Veio ter comigo uma mulher idosa, humilde, muito humilde, com mais de oitenta anos.


Olhei para ela e disse-lhe: «Avó – na nossa região é costume tratar os idosos assim: por avó –, quer confessar-se?» «Sim», respondeu-me. «Mas… não tem pecados!». E ela disse-me: «Todos temos pecados...». «Decerto o Senhor não os perdoa...». «O Senhor perdoa tudo», retorquiu-me segura. «E como é que a senhora o sabe?» «Se o Senhor não perdoasse tudo, o mundo não existiria». Senti uma vontade enorme de lhe perguntar: «Diga-me, senhora! Estudou na [universidade] Gregoriana?» Efectivamente, aquela é a sabedoria que dá o Espírito Santo: a sabedoria interior rumo à misericórdia de Deus. Não esqueçamos esta verdade: Deus nunca Se cansa de nos perdoar; nunca! «Mas então, padre, onde está o problema?» Bem, o problema está em nós que nos cansamos e não queremos, cansamo-nos de pedir perdão. Ele nunca se cansa de perdoar, mas nós às vezes cansamo-nos de pedir perdão. Não nos cansemos jamais, nunca nos cansemos! Ele é o Pai amoroso que sempre perdoa, cujo coração é cheio de misericórdia por todos nós. E, por nossa vez, aprendamos também a ser misericordiosos para com todos. Invoquemos a intercessão de Nossa Senhora que teve nos seus braços a Misericórdia de Deus feita homem.


Rezemos agora, todos juntos, o Angelus.


Dirijo uma cordial saudação a todos os peregrinos. Obrigado pelo vosso acolhimento e as vossas orações. Rezai por mim – vo-lo peço! Renovo o meu abraço aos fiéis de Roma e estendo-o a todos vós que viestes de várias partes da Itália e do mundo, bem como a quantos estão unidos connosco através dos meios de comunicação. Escolhi o nome do Padroeiro da Itália, São Francisco de Assis, e isto reforça a minha ligação espiritual com esta terra, onde – como sabeis – tem origem a minha família. Mas Jesus chamou-nos para fazermos parte de uma nova família: a sua Igreja; estamos nesta família de Deus, caminhando juntos pela senda do Evangelho. Que o Senhor vos abençoe; que Nossa Senhora vos guarde! Não vos esqueçais disto: O Senhor nunca se cansa de perdoar! Somos nós que nos cansamos de pedir o perdão.


Um bom domingo e bom almoço!


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